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Criança de Cuzco (Peru) tocando uma Zampoña Chuli |
À mais ou menos 16 anos atrás, chegava uma
notícia em Itaju de que um grupo peruano de musica, com nome de Kerygma,
estaria se apresentando nas igrejas das cidades da região. Num certo dia, o tal
grupo faria uma apresentação na Igreja Batista de Ibitinga(SP), então meu pai, sem
pensar muito, resolveu ir para conhecer essas musicas estranhas, as quais nunca
tinha visto de perto. Ele decidiu, também, me levar com a minha mãe e meus avós
paternos. Chegando lá, conseguimos nos acomodar nas fileiras de bancos ao meio
do templo. A igreja estava passando por reformas e o culto demorou um pouco
para começar. Mas enfim, começou. O Pastor Antenor iniciou e já foi
apresentando o grupo peruano, lembro como se fosse ontem. Eles começaram a
tocar a primeira musica (que era Salmo 8) e eu, criança que ainda era, fiquei
de pé em cima do bando e me prendi na melodia, nos instrumentos e no modo de
tocar de uma tal forma que foi inexplicavelmente impactante. Ao término do
culto eu ainda estava extasiado. Meu pai comprou todos os produtos que haviam
para serem vendidos no pátio da igreja (dentre eles: Fitas, Cds e Broches). Ao
chegar em casa, na mesma noite, peguei o único aparelho de radio velho que eu
tinha, que só funcionava fitas, coloquei todas elas que meu pai tinha comprado
e dormi escutando-as de uma forma que não conseguia parar de ouvi-las no outro
dia e no outro dia e até hoje com 19 anos de idade não consigo parar de ouvir
as mesmas musicas. Constantemente eu ouvia as musicas peruana no radinho e já
que não tínhamos fone de ouvido eu sempre o colocava perto do ouvido pra poder
ouvir exatamente como era todos os sons de todos os instrumentos. Nesse tempo,
ganhei uma gaita do meu avô que eu a pegava e incessantemente escutava as musicas peruanas e tentava imitá-las em todos os sons
possíveis.
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Parte do grupo Kerygma em Itaju (Jorge primeiro à esquerda) |
Creio que na mesma época do parágrafo
anterior, o pastor Antenor levou o grupo de Kerygma até a minha cidade (já que
o grupo iria se apresentar em toda a região) para se apresentar numa fazenda,
na qual houve um almoço. Fiquei o dia todo entusiasmado com isso e gostei
demais de passar aquele momento novamente, porém mais pertinho junto a eles, em
Itaju(SP).
Por volta do ano de 2002, meu pai começou a
fazer o seminário teológico básico de Ibitinga. Quando ele estava lá, soube que
um dos integrantes, do tal grupo Kerygma, havia ficado no Brasil e estava dando
aula de uma matéria para ele. Logo que ele soube disso, foi logo conversar com
esse tal integrante, o famoso Pastor Jorge Peruano. Papo vai e papo vem, meu
pai lhe contou que eu gostei e gosto muito da musica peruana e perguntou-lhe se
ele não tinha algum instrumento típico para vender. Para surpresa o Jorge tinha
3 instrumentos. Meu pai já foi logo comprando.
Logo que voltou de mais um dia de aula do
seminário, meu pai colocou esses 3 instrumentos em cima de um sofá da sala para
que quando eu chegasse em casa (pois estava brincando na casa de um amigo) tivesse
uma agradável surpresa. Foi isso que aconteceu. Já que cheguei em casa me
deparei com aquelas três preciosidades na minha frente; fui logo –chorando e soluçando
de alegria – colocando em minhas mãos e tentando tirar algum som. Não saiu nada
de primeiro, mas com o tempo fui pegando o jeito. Nesse dia eu não consegui
dizer nem um “obrigado” ao meu pai, pois apenas ficava olhando, chorando e sem
reação para a zampoña zanka, quena e quenacho.
Num meio tempo, certa noite, o pastor Jorge
foi convidado a pregar em Itaju. Eu ainda era pequeno. Lembro-me que ele trouxe
alguns instrumentos e tocou várias musicas junto a um playback. Ao ouvir e vê-lo
tocando eu não conseguia ficar sentado no banco, eu ficava de pé e paralisado.
Nesse dia, eu fiquei com tanta vergonha dele que antes e depois do culto eu
parava nas paredes e ficava olhando de “canto de olho” para ele.
Depois desse dia não parei mais. Comecei a,
verdadeiramente, aprender a tocar os instrumentos que tinha ganhado e logo em
seguida a tocá-los nas ministrações de louvor com a permissão do meu pai (líder
do louvor) e de minha avó (pastora local).
Passado vários anos – agora eu estava
adolescente – Jorge foi convidado novamente para pregar em Itaju. Como agora eu
já tinha conseguido aprender a tocar os instrumentos (que havia ganhado quando
criança), então meu pai perguntou-lhe se nós não podíamos tocar juntos, pelo menos,
duas musicas peruanas no culto. Jorge aceitou. Foi meu primeiro contato com o
ex-integrante do Kerygma. Fizemos um mini ensaio antes do culto e ao desenrolar
da noite tocamos razoavelmente bem.
Aos passar dos anos, meu pai terminou o
seminário e depois de algum tempo ele foi nomeado Pastor pela Igreja Batista
Nacional (isso foi a 3 anos atrás). Na noite de consagração e ordenação eu
decidi fazer uma homenagem para o meu pai, porém uma homenagem diferente e que
surpreendesse a todos. A primeira pessoa com quem conversei – sobre a minha
ideia – foi com o Pastor Jorge peruano. A ideia era a seguinte: tocar duas
musicas peruanas com os instrumentos típicos. O Jorge só seria meu acompanhante
musical. Enfim tocamos, e no final do culto o peruano levantou a hipótese de
formarmos um grupo de musica andina. Meus olhos se encheram de alegria – eu não
podia dizer não – sem hesitar eu concordei e travei uma batalha em minha vida
para conseguir comprar o instrumentos que faltavam para compor o grupo.
Demorou tempo, mas conseguimos a dois anos
atrás. Foi uma surpresa na verdade. Na terceira vez que Jorge foi convidado a
pregar em Itaju, me foi passado que iriamos conversar, ao certo, como faríamos
para comprar os tais instrumentos, quantos seriam, quais os tipos, os preços,
etc. Porém quando eu estava tocando no culto, no momento do louvor
(curiosamente eu estava tocando um instrumento que ganhei quando era criança e
a musica era uma tradução para o português do salmo 8) a minha família, meu
melhor amigo e o glorioso Pastor Jorge peruano entraram pelo meio da igreja
trazendo todos os instrumentos que eu iria comprar, ou seja, meu pai já havia
comprado e decidiram fazer essa surpresa para mim no meio do culto, pois,
curiosamente, era a semana do meu aniversário.
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Todos os meus intrumentos |
Só faltava um instrumento para podermos
começar de fato o nosso grupo de musica andina: o Charango. O Jorge se
comprometeu a compra-lo. Por muito tempo ele não conseguiu, até que num certo
dia meu pai ganhou um bônus da prefeitura por ser funcionário publico e então
decidiu aplicar todo esse dinheiro na compra e importação do charango do Peru.
Deu tudo certo, com o grupo formado tocamos duas vezes em Itaju e uma vez em
Bariri e em Ibitinga. Com isso fui convidado por duas pessoas diferentes para
gravar musicas andinas em estúdio, porém até hoje não gravei nada ainda.
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Pastor Jorge e eu tocando junto ao grupo |
Com o grupo formado, sempre tivemos
dificuldades na composição, pois nenhum (ou quase nenhum) brasileiro sabe tocar
e/ou aprecia a musica peruana, a musica andina. Isso vem me desanimando muito a
cada dia que passa. Outra coisa que vem me entristecendo muito é a distancia e
a agenda que eu e o Jorge temos, nisso nós não conseguimos tempo para nos
encontrar e principalmente para tocarmos por aí.
Pensei e penso, diversas vezes atualmente, em
largar tudo e toda essa história. Mas a minha razão fala mais alto e sempre
decido guardar tudo isso pra mim. Tenho fé que algum dia esse meu sonho, de ser
musico da cultura peruana e andina, vai ser realizado mais cedo ou mais tarde.
Enquanto isso, quanto a todos os instrumentos (que meu pai batalhou tanto para
comprar, fazendo “bicos”, trabalhando horas a mais e deixando de fazer tantas
coisas para adquiri-los), vou deixar todos eles, empoeirados, guardados nas
suas caixas e principalmente guardados no meu coração, pois tenho consciência
que Deus não me fez passar por toda essa história sem nenhum propósito. Ele tem
e quer algo de mim nessa área, tenho certeza disso.
Obrigado Senhor por essa historia em minha
vida. Obrigado pelo meu pai que sempre fez o impossível para mim. Obrigado pela
minha família e pelos meus melhores amigos que sempre me apoiaram. E Deus,
muito obrigado pelo Senhor ter enviado o Pastor Jorge Luis Torres Cuicapusa
para o Brasil, pois sem ele eu não teria levado adiante o meu gosto pela musica andina.